Por uma educação científica mais reflexiva e humanista: a contribuição da visão crítica da ciência de Sandra Harding*
Neusa Teresinha Massoni
Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS).
https://orcid.org/0000-0002-1145-111X
Maurício Marçal Gonçalves Pazetto
Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS).
https://orcid.org/0000-0002-2788-3152
Recepción: 1 de agosto de 2023 | Aceptación: 1 de diciembre de 2023 | Publicación: 28 de febrero de 2024
DOI: http://dx.doi.org/10.18175/VyS15.1.2024.7
RESUMO
Este texto objetiva apresentar uma síntese das ideias principais da epistemologia feminista crítica da ciência de Sandra Harding, com vistas a aproximar essas ideias da educação científica para a formação de cidadãos mais reflexivos, humanistas e refratários a qualquer tipo de discriminação. Algumas visões epistemológicas contemporâneas são trazidas para o diálogo, com o objetivo de incitar estudantes e profesores da educação básica a repensarem concepções estereotipadas de ciência, ainda vigentes na contemporaneidade. Diante da complexidade e da abrangência teórica da análise de Harding, fazemos um recorte baseado em uma de suas principais obras e em alguns artigos. Esperamos que os conceitos e estratos aqui discutidos possam suscitar debates a respeito do pensamento feminista e incentivar alguns professores e professoras a discutirem, em suas aulas de ciências, aspectos da epistemologia e da história da ciência, imprimindo diferentes olhares ao processo de evolução da ciência.
PALAVRAS-CHAVE
Sandra Harding, epistemologia feminista, androcentrismo na ciência, ensino de ciências.
Para una educación científica más reflexiva y humanista: la contribución de la visión crítica de la ciencia de Sandra Harding
RESUMEN
Este texto tiene como objetivo presentar una síntesis de las ideas principales de la epistemología feminista crítica de la ciencia de Sandra Harding, con el propósito de acercar estas ideas a la educación científica para la formación de ciudadanos más reflexivos, humanistas y resistentes a cualquier forma de discriminación. Se traen a diálogo algunas visiones epistemológicas contemporáneas, con el fin de estimular a estudiantes y profesores de la educación básica a replantear concepciones estereotipadas de la ciencia que aún persisten en la actualidad. Dada la complejidad y alcance teórico del análisis de Harding, se realiza un recorte basado en una de sus obras principales y en una selección de artículos. Esperamos que los conceptos y estratos discutidos aquí puedan suscitar debates sobre el pensamiento feminista e incentivar a algunos profesores a discutir, en sus clases de Ciencias, aspectos de la Epistemología y la Historia de la Ciencia, aportando diferentes perspectivas al proceso de evolución de la ciencia.
PALABRAS CLAVE
Sandra Harding, epistemología feminista, androcentrismo en la ciencia, enseñanza de las ciencias.
For a more reflexive and humanistic scientific education: the contribution of Sandra Harding’s critical view of science
ABSTRACT
This text aims to present a synthesis of the main ideas of Sandra Harding’s critical feminist epistemology of science, with the aim of integrating these ideas into science education for the development of more reflective, humanistic citizens resistant to any form of discrimination. Some contemporary epistemological views are brought into dialogue, with the goal of inspiring students and teachers in basic education to rethink stereotypical conceptions of science that still persist today. Given the complexity and theoretical scope of Harding’s analysis, we focus on one of her main works and some articles. We hope that the concepts and layers discussed here can stimulate debates about feminist thought and encourage some teachers to discuss aspects of epistemology and the history of science in their science classes, bringing different perspectives to the process of scientific evolution.
KEYWORDS
Sandra Harding, feminist epistemology, androcentrism in science, science teaching.
Introdução
O objetivo deste texto é apresentar ideias, ainda pouco conhecidas, da filósofa feminista Sandra Harding, com vistas a promover novas compreensões do processo de desenvolvimento da ciência, especialmente de professores e estudantes da educação básica. Assumimos um pressuposto que temos defendido há mais de uma década (Massoni, 2010) de que há relações entre as visões epistemológicas dos professores e suas práticas didáticas: visões da natureza da ciência atuais incitam a abertura a estratégias mais adequadas ao ensino contemporâneo, mais inclusivo, reflexivo e humanista.
Sandra G. Harding é estadunidense, nascida em San Francisco, na Califórnia, e lista entre as mais bem-conhecidas teóricas feministas da contemporaneidade. Seu foco de pesquisa é a teoria feminista, a pós-colonialidade, a epistemologia e a história da ciência. Autora de 17 livros, Harding é professora e pesquisadora emérita da Escola de Graduação em Educação e Estudos da Informação da Universidade da Califórnia (University of California), em Los Angeles, onde foi a primeira diretora do Center for the Study of Woman (1996-2000). Doutorou-se no Departamento de Filosofia da Universidade de Nova York (New York University) e ingressou no Departamento de Filosofia da Universidade de Delaware (University of Delaware), tornando-se professora titular, em 1986. Na Delaware, foi diretora do Programa de Estudos da Mulher entre 1985-1991 e 1992-1993, e ocupou cargos de visitante em várias universidades ao redor do mundo.
As ideias principais de Harding são apresentadas e articuladas em três momentos. Primeiro, abordamos o contexto, as filiações e as fundamentações de seus argumentos, ao defender que a teoria crítica feminista da ciência aponta uma “discriminação contra as mulheres na ciência”; que as lutas feministas passaram de uma postura reformista (análises do que deve ser feito com relação à situação das mulheres na ciência) para uma postura transformadora (modificar os fundamentos da ciência, para torná-la menos imersa em projetos ocidentais, burgueses e masculinos). Segundo, trazemos que/qual olhar Harding lança sobre os processos de evolução da física e da biologia, bem como a interface com algumas visões epistemológicas. Por fim, abordamos contribuições das ideias feministas na formação de professores de física/ciências mais reflexivos e inovadores.
Estudos históricos feministas e ciência
A visão de Harding (1996) parece concordar que um dos objetivos centrais da teoria crítica é o foco na conexão intrínseca entre política, valores e conhecimento; valores formam a base que conduz ao conhecimento (Horkheimer, 2011). Essa visão confronta com 1) a concepção tradicional, empirista-indutivista da ciência, inspirada em Francis Bacon, que concebe o conhecimento científico como sendo fundamentado na imparcialidade, na neutralidade, na não normatividade e na pureza das observações, resultando em leis e teorias verdadeiras e imutáveis; 2) a visão hipotético-racionalista da filosofia da ciência contemporânea (e.g., Popper, 2000; Lakatos, 1993), que defende que a ciência começa com hipóteses, devendo ser testadas experimentalmente, admitindo a falibilidade científica, mas lhe imprimindo uma lógica própria. Importa destacar que visões que levam em conta a história das ideais (e.g., Kuhn, 2003) foram sendo postas ao longo dos séculos 20 e 21.
Harding (1996) diz que há uma discriminação contra as mulheres na ciência. Para contextualizar essa afirmação, examina alguns estudos acerca da igualdade de gênero que revelam valores raciais, sociais e culturais na ciência. Rossiter (1982) descreve as lutas das mulheres para ascender na ciência no final do século 19 e aponta dois contextos limitantes das conquistas femininas: o primeiro trata da subordinação histórica das mulheres, que invisibilizou suas contribuições, como consequência do mascaramento intelectual (concepção que distorce a forma de ver as relações de opressão: o ser masculino não se reconhece como opressor e tende a fazer com que o ser feminino se conforme com as condições existentes). O segundo contexto diz respeito à profissionalização da ciência e tecnologia norteamericanas, que fez com que a relação entre a educação das mulheres e suas oportunidades de emprego e prestígio não fosse igual àquela dos homens.
O efeito Matilda, cunhado por Rossiter (1993), exemplifica o apagamento das contribuições de mulheres cientistas, isto é, as origens dessas contribuições são ignoradas ou atribuídas a homens, que acabam recebendo méritos alheios. O efeito Matilda resultou na desigualdade de oportunidades de emprego e prestígio entre homens e mulheres na profissionalização da ciência.
No final do século 19, o número de mulheres que trabalhavam na ciência não passava de dez. Houve um incremento tal que, na década de 1940, as atividades na ciência absorviam algumas milhares, mas ao preço de as mulheres aceitarem trabalhos segregados e de reconhecimento insuficiente. Embora a justificativa para a criação de colégios e universidades femininas fosse baseada no discurso de igualdade de oportunidades, na prática, a justificação era que mulheres educadas poderiam criar melhor seus filhos para a vida pública. Assim, as oportunidades às mulheres educadas eram limitadas por estereótipos de gênero, criados pela cultura (Harding, 1996, p. 54), que as vinculavam a sentimentos e condutas suaves, emocionais, delicadas. A ciência, por sua vez, era vista como dura, rigorosa, masculina, competitiva e não emocional.
Fedeman (1981) escreveu que a crescente preocupação pública com a discriminação contra as mulheres era devida à pressão relacionada ao incremento do fenômeno de mulheres “solteiras” (responsáveis por suas famílias) associada a duas causas: 1) o grande número de mortes de homens (~3 milhões) na Guerra Civil nos Estados Unidos, abrindo às mulheres postos no trabalho fabril; 2) a partida de milhões de homens (~5 milhões) do Reino Unido, entre 1830-1879, devido à expansão colonial. Os reformadores sociais do século 19 pressionavam, assim, por uma maior abertura da educação e carreiras científicas para as mulheres.
Aldrich (1978), em revisão de literatura sobre as razões de existir menos mulheres que homens na ciência, evidenciou os efeitos do estereótipo de gênero: meninas, que desde a infância, são desanimadas e meninos são encorajados à aquisição de formas de pensamento e habilidades necessárias para se desenvolverem na ciência, na matemática e na engenharia. Vidor (2021) revisou 25 estudos brasileiros e 105 internacionais sobre “questões de gênero”: evidenciou a falta de interesse das meninas em aprender física, uma sub-representação das mulheres na física acadêmica e diferenças nos planos de carreira de mulheres e homens. Isso indica que certos avanços das últimas décadas foram insuficientes para reduzir a desigualdade de gênero na ciência. Silva (2023), em uma pesquisa com mulheres-cientistas negras na física, no Brasil, reafirma que a ciência é uma instituição construída sobre estruturas coloniais opressivas (racismo e sexismo), que operam exclusão epistêmica de sujeitos que não correspondem ao padrão branco, masculino, cis-heteronormativo e eurocêntrico; e sua revisão de literatura indica uma lacuna de pesquisas que articulem gênero e raça pela perspectiva de mulheres, em particular mulheres negras. Ainda são incipientes estudos que buscam responder a perguntas como: quem é considerado cientista? Quem pode falar sobre ciência e em nome da ciência? Quais conhecimentos são valorizados?
Consideramos que as pesquisas feministas e pós-colonialistas de Harding, mesmo que no contexto norte-americano, podem ser tomadas como estudos que abrem questões e contribuem para a consolidação do campo de ação de intelectuais sul-americanos das últimas décadas, que buscam desconstruir o padrão de autoridade intelectual na ciência: homens brancos, de origem europeia, cisgênero, heterossexuais e economicamente privilegiados (Alves-Brito, 2020; Silva, 2023). Anteneodo et al. (2020) mostram, por exemplo, que, no Brasil, embora a maioria da população seja composta por mulheres (51,8%), a participação de mulheres na física é baixa; há a manutenção histórica de segregação por raça, gênero, orientação sexual e origem geográfica nessa área (e.g., espaços de poder e representação acadêmica, como a Sociedade Brasileira de Física, é composta por 68% de homens, por 61% de pessoas brancas, 95% de pessoas cisgêneras, por 88% de heterossexuais, por 59% originárias do sudeste do Brasil, além de que apenas 28% são cientistas negros e negras). Para Harding (1996), o reconhecimento público de ganhadoras de Prêmio Nobel (e.g., Barbara McClintock, Nobel em 1983) chamou a atenção pelo gênero e pelas conquistas científicas, mas não mudou o cenário, pois mulheres de elevada preparação científica seguem trabalhando em níveis mais baixos da hierarquia científica. Saitovitch et al. (2013) chamam de “exclusão vertical” ou “efeito tesoura” às consequências dessa estrutura acadêmica, que opera cortes sistemáticos de mulheres para fora dos postos mais elevados na carreira, mantendo os homens em patamar hegemônico. Outro estudo (Valentova et al., 2017) mostra que as mulheres receberam menos bolsas de pesquisa nas ciências exatas, no período 2013-2014; apenas 20% das bolsas das agências de fomento brasileiras foram ofertadas a cientistas mulheres, o que revela um menor incentivo institucional às mulheres, contribuído, assim, para a manutenção do androcentrismo na ciência.
Para Federici (2017, pp. 11-12), a discriminação contra as mulheres não é um legado de um mundo pré-moderno; é uma formação do capitalismo, construída sobre diferenças sexuais existentes e reconstruída para cumprir novas funções sociais. Coloca que, no contexto das políticas feministas dos anos 1970, em contraponto à teoria marxista ortodoxa (mulheres teriam menos poder social porque como “donas de casa” estariam fora das relações capitalistas), emancipar mulheres através de empregos fabris que os homens recusavam era inaceitável; diz que trabalho doméstico não remunerado e exploração do corpo feminino têm sido os pilares da acumulação capitalista, produzindo/reproduzindo a força de trabalho. Na Europa, a coação de mulheres à procriação levou à imposição, no século 16, da pena de morte pelo uso de contraceptivos (nas plantations, sistema decisivo para o desenvolvimento das colônias europeias na América, os escravos eram mão de obra valiosa e a adoção dessa política tornou as mulheres mais vulneráveis a ataques sexuais [Federici, 2017, p. 224]). Para a autora, isso encobre o fato de que as hierarquias sexuais quase sempre estão a serviço de um projeto de dominação.
No século 21, após mais de 500 anos de exploração capitalista, a globalização ainda alimenta um estado de guerra generalizada, e mulheres continuam a pagar o preço mais alto; especialmente na África e na América, onde a solidariedade está desmoronando sob o peso do empobrecimento e das múltiplas formas de despossessão.
Federici (2017) descortina as relações de poder capitalista do ponto de vista da história oculta das mulheres. Por sua vez, Harding (1996) enfoca as relações sociais no interior da ciência contemporânea e diz que o estereótipo cultural de ciência descrito por Rossiter (1993) como dura, rigorosa, racional, impessoal, competitiva e não emocional está imbricado com questões de gênero, de maneira que o “científico” e o “masculino” são construtos que se reforçam mutuamente.
Para Harding (1996, p. 69), há tensões nas relações sociais na/da ciência. Nos diferentes níveis de trabalho científico, o grau de integração é mais elevado no caso de homens brancos de classes profissionais; homens de minorias e pobres, entretanto, podem alcançar alguma categoria significativa em sua comunidade e família, mas não na cultura científica dominante. Para mulheres, de qualquer classe ou raça, a integração é elevada e reversa: no trabalho assalariado, sua categoria é inferior e a dupla jornada revela as autênticas relações que mantêm a dominação dos gestores.
Sustenta que é falsa a imagem popular da ciência, que fala de um cientista isolado, sem compromissos sociais, dedicado à busca da verdade e que consegue resultados independentes de valores sociais. A realidade da investigação científica é influenciada por fatores sociais, relações de divisão de trabalho, segundo raça, classe social, gênero. A profissionalização da ciência foi um meio pelo qual uma elite de homens brancos conservou seu poder de gestores da ciência. As normas sociais e metodológicas que governam o trabalho científico reforçam a dominação masculina.
Visões epistemológicas contemporâneas e implicações para a educação científica
A principal obra de Harding (1996) aqui discutida ao lançar um olhar crítico à ciência pode ser colocada em interface com algumas visões epistemológicas desenvolvidas ao longo do século 20 e 21. O epistemológo austríaco Popper (2000) e o norte-americano Kuhn (2003) tiveram posições tão marcantes que não é exagero se falar em antes e depois de Popper-Kuhn (Moreira e Massoni, 2016). Antes, predominava a visão empirista-indutivista da ciência; depois, passou-se a compreender que a ciência está longe de ser puramente indutiva ou racional, ou neutra no seu processo de produção de conhecimento; eles mostraram que ciência é uma construção humana, histórica, temporal, social e política. Epistemólogos posteriores (e.g., Lakatos, 1993; Feyerabend, 2011; Toulmin, 1977) avançaram a discussão, argumentando que a natureza da ciência não dispõe de um método científico universal (válido a todos os campos), que o fazer científico se vale de uma metodologia pluralista, que envolve tomada de decisões, riscos e disputas de poder. Assim, não faz sentido fazer uma educação científica que reforce uma imagem de ciência superada, pensada como neutra, não influenciada pelo contexto histórico-social e pelas constantes transformações sociais (Massoni et al., 2018; Moura e Guerra, 2016). Há importantes implicações dessas visões na educação científica; há décadas tem-se discutido na área da pesquisa em ensino de ciências que o ensino deve estar centrado no aluno, propor aprendizagens ativas e ser fundamentado teórica e epistemológicamente, para formar cidadãos mais críticos, humanistas e participativos. Harding, de forma crítica, diz que nem mesmo as imagens projetadas por historiadores, filósofos da ciência e demais entusiastas refletem autenticamente a forma de produção científica, pois não discutem questões de gênero e raça: que os homens são gestores da ciência e que uma condição para mulheres acederem a postos de poder é a aceitação, o consentimento e o apoio à sua forma de organização do trabalho — que é sexista, racista e classista. Entende ela que a hierarquia na ciência reflete a ordem social, por isso qualquer mudança progressista na estrutura científica teria consequências na ordem social geral. Isso torna a luta feminista importante.
Harding (Fernández, 2017) diz que o que estamos fazendo e pensando com relação à internet, aos conflitos, ao incremento da pobreza, à concentração de riqueza, força nossas teorias a mudarem e impulsiona o pensamento filosófico.
O feminismo e a ciência
A postura feminista sustenta que as epistemologias, as metafísicas, as éticas e as políticas das formas dominantes da ciência são androcêntricas. Diante dessa situação, não só na ciência, mas também na sociedade em geral, a luta feminista pode ser dividida em períodos, ondas. A primeira onda (1880-1910) foi uma busca por educação (colégios, universidades femininas, bolsas em laboratórios, graus acadêmicos e ingresso em sociedades científicas); luta pelo voto feminino e pela participação política. Harding (1996) diz que as raras possibilidades na ciência, em museus e observatórios (e.g., Vieira et al., 2021) soavam aos homens como uma usurpação feminina de um território exclusivamente masculino; significavam uma ameaça de “iminente feminização”.
A segunda onda feminista (1960-1990), mais radical, esteve alinhada a levantes na França (1968) de trabalhadores e da população LGBTs, e a protestos nos Estados Unidos contra a guerra do Vietnã etc., produziu estudos teóricos sobre a condição da mulher e as estruturas que as oprimiam. Distinguiram teoricamente sexo (relativo a características biológicas) de gênero (construção social que impõe papéis a depender do sexo). Houve também estudos que questionavam a teoria feminista hegemônica, proposta por acadêmicas brancas que tomavam o fenótipo europeu como padrão, caracterizando qualquer outra etnia como produtora apenas de conhecimento popular (Rosa et al., 2020).
A terceira onda iniciou em 1990 no contexto de mudanças na sociedade ocidental: fim da União Soviética, queda do muro de Berlim, dissolução de ditaduras na América Latina, espalhamento do neoliberalismo, revolução na comunicação etc. As feministas passaram a discutir o patriarcado (crença sexista de que a dominação do feminino pelo masculino é “natural”), a sexualidade e o empoderamento feminino. Em 1989, Crenshaw (2011), pioneira da teoria crítica da raça, introduziu a “interseccionalidade” como ferramenta de análise da condição de mulheres atingidas por diferentes opressões (etnia, cor, classe etc.).
A despeito da crença ocidental no caráter progressista da ciência contemporânea, Harding (1996) diz que está a serviço de tendências retrógradas: sua estrutura social, as formas de definir investigações e desenhar experimentos, os modos de construir significados são sexistas, racistas, classistas e coercitivos no plano cultural. Diz não ter dúvidas que racismo, classismo e imperialismo cultural restringem, às vezes mais que o sexismo, as oportunidades das mulheres; que o reconhecimento das diferenças de gênero dentro dos grupos raciais e das diferenças raciais e culturais dentro dos grupos de gênero nas epistemologias e nas políticas emancipatórias têm um importante papel: a “diferença” pode ser um ponto “de reunião” de projetos de investigação fundados na solidariedade.
Esses preconceitos, assevera, estão baseados em crenças falsas (costumes, educação errônea etc.) e em atitudes hostis que se introduzem nas investigações, na definição dos problemas científicos, no delineamento da pesquisa, bem como na coleta e na interpretação de dados. Reconhece, contudo, que tentativas de “desestabilização” dessas categorias da/na prática científica tem raízes na tradição da moderna história ocidental, no seu compromisso com a crítica às práticas e às crenças tradicionais (e.g., o androcentrismo é “natural” e bom; a racionalidade científica tem sempre um caráter progressista). Harding (1993) diz que:
O esforço inicial da teoria feminista foi o de estender e reinterpretar as categorias de diversos discursos teóricos de modo a tornar as atividades e relações sociais das mulheres analiticamente visíveis no âmbito das diferentes tradições intelectuais. Se a natureza e as atividades das mulheres são tão sociais quanto as dos homens, nossos discursos teóricos deveriam ser capazes de revelar nossas vidas com tanta clareza e detalhe quanto supomos que as abordagens tradicionais revelem as vidas dos homens. (p. 7)
Pontua que a origem das críticas feministas está no “exterior” da cultura moderna ocidental. Como já discutido, as mulheres são “o outro”, em contraste aos homens, que exercem o controle, propõem os projetos e detêm o poder na ciência.
Harding (1996), no prefácio, afirma que havia diferentes tendências feministas, à época, e que seu objetivo era identificar tensões e conflitos entre elas, discutir conceitos inadequados ou obstáculos despercebidos e alcançar significados e práticas emancipatórias:
[...] não proponho que a humanidade tire algum proveito desistindo das tentativas de descrever, explicar e compreender as regularidades, as tendências causais subjacentes e os significados dos mundos natural e social pelo fato de que as ciências que temos sejam androcêntricas. Trato de colocar fim ao androcentrismo, porém não à investigação sistemática. (p. 12)
Esse extrato aclara seu objetivo: colocar em perspectiva a ciência moderna e seu caráter androcêntrico; melhorá-la, buscando dar fim ao androcentrismo, e não depor contra o seu papel na sociedade.
Vida social generalizada: o uso social da ciência
Os estudos feministas analisaram relações sociais entre os gêneros dentro de marcos conceituais das disciplinas; obtiveram que o que normalmente consideramos conceitos, teorias, metodologias objetivas e verdades transcendentais (abarcam todos os humanos) não chegam a tanto. São produtos do pensamento, carregam visões de seus criadores, marcas de gênero, classe social, raça e cultura. Para Harding (1996), as ciências naturais têm sido objeto de exame feminista, e isto tem causado “expectativas e temores”. Os medos vêm do reconhecimento de que, em nossa cultura, a racionalidade científica está presente nas formas de pensamento e na ação das instituições públicas, se estendendo à vida privada (apelamos à ciência para falar sobre infância, educação sexual, tecnologia…).
O uso social da ciência mudou no último século: esperava-se “dominar a natureza” para gerar bem-estar social, mas a ciência converteu-se num esforço para conseguir acesso desigual aos recursos naturais, para fins de dominação. O cientista deixou de ser visto como um sujeito estereotipado — gênio excêntrico, que gasta seu tempo com temas que lhe interessam — e passou a compor uma numerosa mão de obra especializada, treinada para entrar nos laboratórios universitários e industriais em que se espera que 99% de suas investigações tenham aplicação imediata; se esses impérios industrializados não conseguem demonstrar que a busca do saber objetivo, imparcial e racional está a serviço dos “melhores interesses de progresso social”, então não há como justificá-la.
As feministas não foram o primeiro grupo a criticar o “modo” da ciência: nas lutas contra racismo, colonialismo, capitalismo, homofobia, movimentos ecologistas e antimilitares etc., foram analisados os usos e abusos da ciência. Butler (2017), em análise de discursos envolvidos na constituição da categoria “mulheres”, buscou desconstruir categorias fundacionais — “sexo”, “gênero” e “desejo”; apontou que as identidades são discursivamente constituídas num processo performativo moldado por relações de poder, racializadas, posicionadas socioeconomicamente.
Harding (1996) diz que as feministas tocaram em fibras sensíveis. Inconformadas com a baixa prioridade que os planos de reforma social davam às preocupações das mulheres, tomaram “gênero” como categoria analítica; é com relação a esse marco que os humanos pensam e organizam a vida social. Ela assume que a vida social generalizada se produz através de três processos: 1) é o resultado de atribuir dualismos de gênero a diversas dicotomias que nada têm a ver com diferenças de sexo (e.g., modelo de universo centrado na Terra, associado à feminilidade, substituído pelo centrado no Sol, associado à masculinidade, reduzindo a imagem da mulher à natureza selvagem e incontrolável) — simbolismo de gênero; 2) é consequência de recorrer a esses dualismos de gênero para organizar a vida social (e.g., dividir o trabalho segundo o gênero) — estrutura de gênero; e 3) é uma forma de identidade individual, socialmente construída, que se correlaciona de modo imperfeito com as diferenças de sexo-gênero individual.
Esses três sentidos da masculinidade e feminidade encontram diferenças nas distintas culturas, mas praticamente todas concebem maior valor a tudo o que é relativo ao homem. As críticas feministas afirmam que também a ciência está generalizada.
Harding (1993; 1996) se referia à sociedade norteamericana, mas não é difícil transpor suas análises para a atualidade, em nossos países latino-americanos, enquanto sociedades racializadas, classistas e com enormes desigualdades sociais e educacionais (Alves-Brito et al., 2020):
Hoje, quando as barreiras formais contra o acesso das mulheres à ciência e à educação de engenharia, aos diferentes degraus, publicação, contratos laboratoriais e aos conselhos das sociedades científicas são finalmente ilegais na Europa, nos Estados Unidos e em muitas outras partes do mundo, permanece desafiador identificar e, então, eliminar as poderosas e constantes fontes de discriminação. (Harding, 2003)
Estudos recentes mostram que, globalmente, ainda há uma presença reduzida de mulheres nas ciências e na física em particular. A União Internacional de Física Pura e Aplicada (International Union of Pure and Applied Physics) constituiu grupos de estudos para tentar reverter a perversidade desse quadro. Para Saitovitch, Lima e Barbosa (2013), há um percentual reduzido (~ ٢٥٪) de mulheres nos diversos níveis da carreira na física em diferentes regiões do mundo.
Cinco programas de investigação
A crítica feminista às ciências naturais tinha se alternado em cinco programas de investigação, todos, diz Harding (1996), com públicos, temas e ideias sobre ciência e gênero.
Harding (1996; 2007) reafirma que o feminismo é um movimento político para a mudança social; que há um paradoxo epistemológico porque muitas afirmações motivadas por esses cinco programas decorrem de investigações sobre as ciências naturais, e que é útil dividir as principais respostas feministas em três tipos: empirismo feminista; ponto de vista feminista e pós-modernismo feminista.
O empirismo feminista sustentava que o sexismo e o androcentrismo seriam traços sociais corrigíveis mediante a adesão às normas metodológicas vigentes na investigação científica; e que o movimento da mulher oferece oportunidade de ampliar essa perspectiva, pois havendo mais mulheres cientistas, seria mais provável que elas, não os homens, percebessem o viés androcêntrico. Harding (1996) diz que defensoras dessa linha não se aperceberam que isso subverte o empirismo; o empirismo feminista supõe ser mais provável que feministas (sejam homens ou mulheres) obtenham mais resultados não enviesados que os homens, mas ela acha isso pouco provável.
O ponto de vista feminino sustenta que a posição dominante dos homens na vida social se traduz em um conhecimento parcial e perverso; que a posição subjugada da mulher abriria caminho para um saber mais completo; que o movimento da mulher contribuiria com “teoria e motivação” para transformar a perspectiva das mulheres em “ponto de vista”, em fundamento moral e cientificamente preferível. Harding (1996) entende que essa linha adere à crítica da “má ciência” (bad Science) ou “ciência comum” (Science as usual) e menciona descrições de historiadores em que a política sexual aparece influenciando a ciência e esta, por sua vez, como desempenhando um papel significativo nessa política. Para ela, o que pode ocorrer é que uma possa fornecer recursos políticos, éticos e morais para a outra, abrindo novas perguntas: deveria haver pontos de vista femininos, negros e brancos? De classe trabalhadora e de classe profissional? De norte-americanos e nigerianos? Os estudos mostram que a objetividade científica não se pode incrementar pela neutralidade ante valores. Ao contrário, os compromissos com valores e projetos antiautoritários, antielitistas, participativos e emancipatórios podem aumentar a objetividade da ciência.
O pós-modernismo feminista nega tanto os supostos do empirismo feminista como os do ponto de vista feminista, e compartilha de supostos de outros movimentos intelectuais (semiótica, psicanálise, estruturalismo etc.). Esta é a corrente à qual Harding parece se filiar. Ela diz que as feministas estão dispostas a construir, sob a base do “saber subjugado” sobre o mundo, mais do que os grupos cujas experiências se ajustam a esquemas conceituais tradicionais. Não vê razoabilidade em aceitar que a ciência moderna ocidental seja a única instituição capaz de contar uma história verdadeira da/sobre a natureza. Há riqueza não somente nas tradições mais antigas (arcaicas, chinesas, islâmicas etc.), como também há nas práticas inovadoras de tradições indígenas contemporâneas em todo o mundo.
Contudo, afirma que sua filiação ao pós-modernismo é cuidadosa, pois entende que há o perigo de se cair em um absolutismo absoluto que, quando impensado, pode assumir uma postura alienante das necessidades políticas e intelectuais que orientam o pensamento e as práticas sociais. Argumenta que essas cinco linhas investigativas, que são críticas à ciência, são iluminadoras e têm a virtude de nos atentar para as incoerências socialmente daninhas, comuns a todos os discursos não feministas (1996, p. 27).
O gênero e a ciência
Harding (1996) assume que a construção de uma teoria de gênero como categoria analítica para as ciências naturais tem enfrentado obstáculos, mas que na história, antropologia, literatura etc., foi possível teorizar sobre gênero depois de reconhecer as limitações de três tipos de projetos desenvolvidos pelas feministas — “mulheres notáveis”, “contribuições femininas” e estudos sobre “vitimologia”. Só quando estudiosas feministas realizaram esses estudos, deram-se conta da inadequação dos enfoques. Por exemplo, histórias de mulheres notáveis (romancistas, poetas, artistas) mostram que elas conseguiram se converter em figuras históricas porque sua situação era privilegiada, e que suas histórias de vida não facilitam uma melhor compreensão da vida cotidiana da maioria de mulheres. As “contribuições femininas” eram do tipo que os homens, de sua perspectiva, acreditavam que fosse história e cultura, ocultando o que as atividades das mulheres em um mundo de homens significavam para elas. Por fim, estudos da “vitimologia” deram valiosas intuições, desvelando peculiares formas utilizadas pelas mulheres para lutar contra a misoginia (aversão e falta de confiança nas mulheres) e a exploração, que a investigação tradicional deixava de lado.
Harding (1996) coloca que, nas ciências naturais, os resultados desses projetos são marginais, pois mulheres seguem sendo excluídas do fazer científico. Trajetórias como de Marie Curie e Barbara McClintock são raras; poucas mulheres conseguiram alcançar um nível de iminência científica, à sua época, e isso tem obscurecido a necessidade de uma teorização mais adequada de gênero como categoria analítica.
Os usos das críticas feministas na ciência podem ser incompreensíveis para a maioria de cientistas não feministas, historiadores, sociólogos e filósofos da ciência, pois sua formação científica é hostil aos principais métodos de busca de saber sobre a vida social (e.g., enfoques interpretativos, crítica literária etc.). E a teoria de gênero é uma delas. As ciências naturais, para Harding (1996), são dogmáticas (centradas em fatos, indução, reducionismo, neutralidade em relação a valores), reavivam filosofias superadas, empiristas e positivistas, e resistem em elevar o gênero a uma categoria teórica.
Admite que os supostos metodológicos e ontológicos da investigação social e da física são diferentes, mas questiona: na física, as explicações não seriam mais genuínas se os físicos fossem formados para examinar criticamente suas origens sociais e as consequências sociais de seus sistemas conceituais? Harding critica a filosofia, história e sociologia da ciência, pois entende que, em não sendo ciências naturais, tomam como objeto de estudo crenças e práticas sociais, e teriam que pensar que as teorias e habilidades interpretativas são fundamentais para compreender como os cientistas explicam as regularidades do mundo. Gênero poderia ser tomado como um elemento dos esquemas conceituais da/na ciência. Alguns sociólogos da ciência adotam, de forma limitada, esse enfoque (e.g., David Bloor ao se preocupar com “sociologia do erro” e com a “sociologia do conhecedor” [Massoni e Moreira, 2020]). É limitada por não analisar a condição social da mulher na ciência.
Kuhn (2003) deu início a autênticos estudos sociais da ciência e desmistificou as chamadas “reconstruções racionais”. Kuhn enfoca processos sociais em que se desenrolam as investigações científicas. Harding vê como um renascimento de estudos sociológicos, históricos, antropológicos da ciência, deixando de lado antigos dogmas da prática científica. Porém, tais reconstruções ainda são incompletas porque têm evitado examinar as questões de gênero na ciência. O entusiasmo filosófico e a visão tradicional de ciência seguem sendo reacionários às explicações críticas feministas, e é sob esse pano de fundo que o enfoque de ciência “que adoto neste livro é mais completo do que aquele dos entusiastas da ciência; trato de identificar as tendências causais presentes na vida social que deixam pegadas de gênero em todos os aspectos da empresa científica” (Harding, 1996, p. 32).
Ciência sagrada?
A autoimagem da ciência (história que faz de si mesma) aparece, para Harding (1996), como uma espécie de mito das origens. O mito das origens de nossa cultura científica diz que, em parte, surgimos de uma “concepção mágica da busca ideal do conhecimento”, a qual recomenda que utilizemos análise e exame crítico das crenças herdadas para compreender tudo o mais, menos a própria ciência.
Quine (1953) aponta certos dogmas do empirismo: a crença na diferença fundamental entre verdades analíticas (independentes dos fatos) e verdades sintéticas (baseadas em fatos); o reducionismo, concepção de que todo enunciado científico equivale a algum construto lógico vindo da experiência imediata; crença na separabilidade dos fatos e seus significados etc. Quine diz que, se esses dogmas fossem abandonados, seria possível perceber que a suposta distinção entre ciência natural e metafísica não é tão clara.
Harding critica a postura (de cientistas e filósofos da ciência) de aceite desses dogmas; diz que o resultado é uma concepção inadequada da racionalidade científica (lhe impondo limites um tanto mágicos) e da natureza da ciência, convertendo a ciência em algo sagrado, apartada das demais atividades sociais, o que retira os cientistas do campo humano.
Reafirma que seu objetivo não é descaracterizar a ciência natural, mas mostrá-la como um tipo de atividade social. Embora a ciência não seja uma atividade social fundamentalmente única, pois há outro mundo — das emoções, valores políticos, do inconsciente individual e coletivo, dos eventos sociais e históricos (narrados em romances, teatro, poesia, música, arte…) — no qual passamos a maior parte de nossas horas de sonho e vigília, sob constante ameaça de reorganização pela racionalidade científica. Um dos projetos feministas é revelar relações entre esses mundos, as razões das exclusões e as formas como a ciência é conformada através dessas ausências (Harding, 1993).
O androcentrismo na biologia
Harding (1996) aponta que o traço masculino na ciência é evidente tanto na definição de problemas científicos como na construção de conceitos, teorias, metodologias e interpretações. É comum pensar que a biologia está menos sujeita às tramas a que estão sujeitas as demais ciências da natureza, mas uma análise cuidadosa pode mostrar que a investigação biológica é vulnerável aos preconceitos masculinos.
Os biólogos comumente creem que resultados de estudos evolutivos e neuroendocrinológicos interseccionam-se, o que configura um poderoso argumento em favor dos papéis sexualmente determinados. Descrições evolucionistas androcêntricas dizem que as raízes e algumas condutas humanas (e.g., a divisão de trabalho segundo o gênero) se encontram na história da evolução humana; que as origens da vida ocidental (homens regem o âmbito público e mulheres os trabalhos domésticos) se situam na reunião do “homem caçador” com outros homens para matar grande animais, enquanto as mulheres ficavam na caverna para cuidar dos filhos, hipótese a qual Darwin seria adepto.
Harding (1996) recorre a estudos de Helen Longino e Ruth Doell, que demonstram que o traço masculino pode ser introduzido tanto na investigação evolucionista como na endocrinológica; questionam sobre o tipo de dados de que dispõem e sobre que hipóteses se apresentam como respostas. Longino e Doell mostram que os dados que servem para responder às questões anatômicas (e fisiológicas) provêm de fósseis; que dispomos de poucos fósseis dos primeiros hominídeos; que os métodos modernos de datação desses restos permitem incluí-los de maneira bastante confiável na sucessão evolutiva; e que é relativamente confiável a base de dados da qual se extraem conclusões sobre condutas individuais. Porém, a polêmica se centra nos “dados relevantes para a evolução da conduta social, interativa, e sua relação com o desenvolvimento da anatomia humana” (Harding, 1996, p. 84). Antropólogos também se mostram céticos com relação aos supostos de que as pautas sociais das sociedades contemporâneas de caçadores e coletores sejam as mesmas de nossos antepassados.
Longino e Doell (1983) mostraram como se introduz o androcentrismo na teoria da evolução, na seleção de problemas científicos e na sua concepção teórica, nos métodos de obtenção de dados que são utilizados como provas. As hipóteses evolutivas não são verossímeis, tampouco o serão os enunciados deterministas que se baseiam na conjunção dessas hipóteses.
A teoria feminista é mais global e coerente do que a “hipótese do homem caçador”. Ferramentas (de pedra) do “homem caçador” não apenas serviam para a caça, não eram exclusivamente de uso masculino; as mulheres primitivas contribuíram inventando ferramentas de paus e juncos, que serviram a outros fins, por exemplo, à bipedestação, à postura ereta, à melhoria da dentição e à maior cooperação entre caçadores. A bipedestação estreitou o canal do parto, e o uso de ferramentas diferenciadas produziu pressões seletivas na direção do aumento do tamanho do cérebro e, consequentemente, do crâneo. A solução desse dilema levou a que as crias humanas nascessem em uma etapa menos madura do que aquela típica dos pré-humanos, requerendo maior atenção dos adultos. Assim, inverte-se a perspectiva, colocando “mulheres como inovadoras e contribuidoras, mais que os homens, para o desenvolvimento das presumidas características humanas, […] maior inteligência, flexibilidade” (Harding, 1996, p. 87).
Contudo, considera que estas não são razões que justifiquem denominar a ciência androcêntrica como sendo “má ciência” (bad Science) ou “ciência comum” (Science as usual), pois está imersa em estruturas e metodologias tão complexas que esse rechaço (feminista) em nada contribuiria para mudá-la. De todo modo, diz que a igualdade de oportunidades para as mulheres na ciência exige a redução drástica dos estereótipos de gênero, da divisão de trabalho segundo o gênero e da afirmação da identidade masculina, bem como a eliminação do classismo e do racismo.
Física: um paradigma na ciência?
Uma concepção ainda presente (nos livros, nas salas de aula) é que o “método científico” seria capaz de produzir explicações inquestionáveis das regularidades da natureza (Antunes-Souza, 2021). Para Harding (1996), a exclusividade do método científico nunca esteve clara; diferentes ciências têm metodologias distintas (nada há em comum entre os métodos da física de partículas e da biografia molecular). Alguns filósofos da ciência, tentando identificar características metodológicas, assumiram que o que distingue ciência é uma postura de refutação das hipóteses mediante testes experimentais (Popper, 2008). Harding chama-a de “postura psicológica” e assevera que, embora Popper problematize a indução, defendendo a dedução, isto é frágil; agricultores das sociedades campesinas também usavam indução e dedução, porém foram excluídos do status de cientistas. Isso ajuda a criar uma ideia mitológica e obscura em torno do método científico utilizado na física. Harding (1996) duvida da presumida neutralidade (das expressões matemáticas e das leis da física) com respeito aos valores sociais; sustenta que uma ciência social crítica e reflexiva deveria ser o modelo a todas as ciências; e se a física apresenta alguns requisitos especiais para chegar às explicações, são precisamente isto, especiais (p. ٤٠).
Elenca argumentos sobre como as condições necessárias para uma investigação social pode reinterpretar condições da explicação física: 1) o objeto da física é menos complexo que o das ciências sociais — física se ocupa de sistemas simples (e.g., o modelo do sistema solar) ou de aspectos simples de sistemas complexos (e.g., a física do sistema ecológico); estes podem ser tomados como modelos simples porque são fechados, deterministas, desprezam a possibilidade presumível da atividade humana poder fazer desaparecer nosso planeta e perturbar o sistema solar; 2) os conceitos/hipóteses da física requerem atos de interpretação de envergadura não menor que os das ciências sociais — as fórmulas/leis físicas são como os julgamentos nos tribunais, só adquirem significado mediante a aprendizagem (decisão) de como aplicá-las, então não deixa de ser um processo de interpretação social; 3) enquanto o biólogo evolucionista e o geógrafo econômico têm que levar em conta as atividades intencionais dos humanos, os físicos não precisam se preocupar com causas intencionais dos movimentos da matéria, e 4) a explicação de fenômenos sociais requer compreender os significados e o propósito que um ato intencionado tem para seu autor, requer explicar as origens, as formas e o predomínio de crenças e ações humanas.
Assim, argumenta que a física se beneficiaria se se preocupasse em responder por que uma visão científica de mundo (que toma a física como paradigma) exclui sua história, enfocando apenas em explicações causais de tudo o que encontramos no mundo. É uma ficção manter a separação analítica da ciência, com respeito à vida social. Harding (1996) sustenta que é preciso (re)avaliar o pressuposto de que a física é/seria o paradigma da ciência; estudos feministas tentam mostrar que as leis da mecânica de Newton, a relatividade de Einstein são carregadas de valores e simbolismos de gênero.
Valores androcêntricos e burgueses que têm se projetado, por exemplo, na astronomia e na física modernas, em grau não menor que nas ciências medievais que elas substituíram. Para Harding, há inadequadas conceituações de gênero que obstaculizam as críticas feministas. Por exemplo, só se dá atenção a duas formas (masculina e feminina) de gênero; oculta-se que as diferenças de gênero nos indivíduos e nas atividades humanas não são simétricas. Além disso, defende que são necessários estudos para explicar a reduzida representação feminina nos cursos (das ciências físicas, matemáticas, engenharias…), nos laboratórios, nas sociedades e nas publicações científicas; e como a cultura opera contra a motivação para as meninas/mulheres adquirirem habilidades necessárias para se dedicarem à ciência (Harding, 1996, p. 48).
A autora propõe que compreender as ciências sociais é fundamental para descobrir os efeitos de gênero nas ciências naturais. Primeiro porque as ciências sociais têm tratado de imitar os métodos e os objetivos assumidos nas ciências naturais (as imagens deformadas da atividade humana que alguns investigadores sociais apresentam não se devem só aos seus objetos de estudo, eles carregam cânones da investigação das ciências naturais). Um segundo ponto é que as ciências naturais são um fenômeno social, criado em determinados momentos históricos e culturais; e gênero (como classe social, raça, cultura) não só é uma variável a respeito das crenças sobre as diferenças, mas compõe as estruturas mais formais de crenças sobre os limites entre a natureza e a cultura — e é pouco provável que as estruturas formais das crenças da ciência natural estejam imunes a esse tipo de generalização. Tanto as teorias sobre gênero, e as crenças relativas ao gênero, como as teorias sobre a ciência e suas atividades, são teorias sociais. Temos variadas “crenças folclóricas” sobre o que é o gênero e o que é ciência, porém crenças herdadas guardam pouca relação com o mundo que nos rodeia.
Gênero é um construto social, não um dado biológico.
Harding defende que um exame da ciência como se fosse um personagem pareceria menos extravagante se levássemos em conta argumentos de Kuhn: teorias científicas nascem através de processos diferentes dos responsáveis pelo seu posterior desenvolvimento; as lutas que uma teoria enfrenta em sua infância deixam marcas no caráter da teoria madura; os defensores de uma teoria frequentemente reescrevem sua história de maneira a ocultar a natureza de suas lutas iniciais.
Imagens contemporâneas na física
Para Harding, projetos que carregam simbolismos de gênero reforçam certas dicotomias: “dados duros” versus “dados brandos”; “rigor científico” versus “tolerância” das ciências sociais; razão versus intuição; natureza versus cultura etc. Destaca duas “falas” da segunda metade do século 20 para exemplificar as apelações morais e a política de gênero que elas revelam. O físico Feynman encerrou seu discurso na cerimônia do Prêmio Nobel, em 1964, dizendo:
Este foi o princípio; a ideia me parecia tão evidente e tão interessante que me apaixonei profundamente dela. E, como a paixão de uma mulher, só é possível se não a conheces muito bem, de maneira que não possas ver seus defeitos. Estes se manifestam mais tarde, depois do que o amor é bastante forte para permanecer com ela. Portanto, eu mantive esta teoria, apesar de todas as dificuldades, graças a meu entusiasmo juvenil... O que aconteceu com a antiga teoria à qual me apaixonei quando era jovem? Bem, eu diria que se converteu em uma dama anciã, a qual manteve muito pouco de sua atratividade […] Mas podemos falar sobre o melhor que se pode expressar a uma anciã: ela se converteu em uma mãe excelente e deu à luz a alguns filhos muito bons. (citado por Harding, 1996, p. 106)
O eminente epistemólogo da ciência, Paul Feyerabend, ao argumentar por que sua reconstrução da história da ciência é preferível à de Popper, diz:
Esse desenvolvimento, longe ser indesejável, converte a ciência de uma senhora severa e exigente em uma cortesã atrativa e complacente que tenta prever todos os desejos de seu amante. Claro, a nós compete escolher como companhia um dragão ou uma gatinha. (Harding, 1996, p. 106)
Ambos, o cientista e o filósofo, são homens que tomam suas companheiras (ciência e suas teorias) como mulheres exploráveis; replicam ideias ultrapassadas, inspiradas em Francis Bacon no nascimento da nova ciência, muitas das quais se mantêm até hoje. Harding diz que, para construir uma oposição efetiva à vida política e à ciência e às epistemologias androcêntricas e burguesas, é preciso generalizar condições para que as mulheres possam contribuir, o que, do ponto de vista político, resultará em uma sociedade estruturada não só por posições machistas. A epistemologia feminista é uma posição comprometida em outorgar aos gestores da ciência uma sensibilidade tal que permita captar aspectos da natureza e da vida social inacessíveis às atividades caracteristicamente masculinas.
A visão de Harding (1996; 2003) alinha-se à de outras feministas (Butler, 2017; Federici, 2017) ao argumentar que a teoria feminista contemporânea, enquanto filosofia pós-moderna, compartilha com outras formas de pensamento uma incerteza sobre os fundamentos e métodos adequados para explicar e interpretar a experiência humana; que faltam regras de consenso sobre categorização, avaliação e validade das teorias. Enquanto os europeus (homens) concebem o “eu” como autônomo, individualista, interessado, fundamentalmente isolado das outras pessoas e da natureza, atribuem às mulheres, aos africanos um conceito de “eu” como dependente dos outros. Assevera que essas ontologias opostas resultam em éticas e epistemologias opostas: aos europeus/homens se atribuem éticas que privilegiam regras, competição, separação do conhecedor do objeto de conhecimento, manipulações, medidas impessoais e cerebrotônicas; aos africanos e mulheres, servem éticas que ressaltam a responsabilidade de incrementar o bem-estar dos complexos sociais através de processos contextuais, provisórios de decisão, e epistemologias que situam o ser que conhece como parte do conhecido, o conhecido como afetado pelo processo do conhecer, e o processo como elemento que une mãos, cérebro e coração. Eis aí um caminho apontado para um novo fazer científico.
Contribuições da visão feminista de Harding para a formação de professores
Pontuamos que uma versão ampliada deste texto tem sido utilizada em uma disciplina de história da física e epistemologia, no curso de formação de professores de física de uma universidade pública brasileira. O mapa conceitual da Figura 1 foi construído por um licenciando, como tarefa na disciplina, que utiliza mapas como ferramenta para discutir, no grande grupo, compreensões sobre a natureza da ciência. Este texto almeja significância para a formação de professores, na medida em que uma formação docente reflexiva pode ter implicações na educação científica básica, ao apresentar e discutir uma visão de ciência nova e pouco conhecida, da perspectiva feminista, com potencial de instigar discussões críticas e abordagens didáticas diferenciadas, com um olhar tanto a aspectos externos da ciência (trajetórias de cientistas, relações ciência-sociedade) como àqueles internos da natureza da ciência (metodologias, conteúdos, visões epistemológicas). Como já dito, é fundamental privilegiar aprendizagens ativas e fundamentadas teórica e epistemologicamente se desejarmos formar cidadãos humanistas e mais participativos na sociedade em que se inserem.
A explicação do licenciando mostra-se reflexiva: o mapa (Figura 1) representa a relação entre algumas ideias da epistemologia contemporânea e os conceitos hardingnianos: no interior da atividade científica existe uma estrutura social, que não é inofensiva, pelo contrário, ela produz impactos sobre a produção científica. Harding reconhece na ciência uma estrutura social dissimulada; de um lado, possui um discurso ético que defende uma ciência aberta para todos, um discurso progressista, independente dos interesses sociais, cujo objetivo é buscar a verdade, esteja onde ela estiver; por outro lado, na prática, possui uma hierarquia social em seu interior baseada em questões de gênero, raça e classe social, mais do que o discurso ético estipula.
No passado, essa estrutura social era explícita. Havia, quando havia, universidades só para mulheres ou só para os negros (e.g., Clark [1988] explicita que a segregação racial na educação norte-americana era amparada por leis). Era, sem dúvidas, uma situação injusta, mas não dissimilada. Hoje, a discriminação tornou-se informal e dissimulada: não há leis e restrições à entrada de mulheres na ciência, mas a estrutura social das instituições científicas preserva uma hierarquia sexista, androcêntrica, sustentada em estereótipos de gêneros que desfavorecem as mulheres.
Os discursos sexistas do passado perderam sustentação teórica, mas persistem crenças sexistas; como o estereótipo de que a mulher é um ser “delicado, emocional e de atitudes suaves”. O mesmo ocorre com ideias positivistas de ciência, já desmontadas pela epistemologia contemporânea, mas que circulam nas instituições e meios acadêmicos: a ciência é “rigorosa, dura, competitiva e extremamente racional”. Dessa mistura de estereótipos (sexistas e positivistas), surge um hiato: como um ser delicado, emocional e com atitudes suaves poderia fazer bem uma atividade que é rigorosa, dura, competitiva e extremamente racional? Ou pior, faz pensar se pesquisas feitas por mulheres não acabariam perdendo o rigor e a seriedade; introduz o medo de que a presença de mulheres na ciência usurparia espaços historicamente ocupados por homens.
Essa aparente contradição, só existente nos preconceitos relativos às mulheres, produz o “efeito matilda”. Crenças não são inócuas, elas produzem ações. A crença de que há uma incompatibilidade entre o gênero feminino e o trabalho científico fez com que muitos trabalhos científicos de mulheres fossem ignorados, apagando as contribuições femininas na ciência. Trabalhos femininos são menos lidos, menos citados e lembrados, ganham menos prêmios e suas autoras recebem menos crédito, resultando em menos oportunidades de trabalho, que exigem um currículo mais robusto; e gerando o chamado “efeito tesoura” (Saitovitch; Lima; Barbosa, 2013).
Figura 1: Mapa conceitual construido por um Licenciando em Física, semestre 2022/2, que situa a postura crítica de Harding em relação a conceitos de outras posturas epistemológicas contemporáneas.

Fonte: construído pornciand um liceo em física, semestre 2022/2.
Esse mecanismo psicológico e social produz uma discriminação informal, resulta em mais chances aos homens de subir na hierarquia científica, com maior poder de decisão sobre quais fenômenos merecem ser estudados. Uma sociedade na qual os homens possuem o monopólio da atividade científica acaba produzindo teorias que servem para justificar a discriminação, não somente no âmbito da ciência, mas também em setores diversos da sociedade. Se apenas um grupo controla a pesquisa científica, o conhecimento que ali se constrói será parcial, enviesado e empobrecido.
Harding argumenta que, se mais mulheres fossem integradas à ciência, novas perspectivas poderiam surgir; se inovações das tradições indígenas e africanas fossem levadas em conta teríamos mais democracia e uma ciência mais humanista.
Conclusão
Interpretamos que a postura teórica feminista crítica de Harding ao androcentrismo não depõe contra ciência. Ela assume o feminismo como luta política para a melhoria das relações sociais, para a valorização e para o reconhecimento das contribuições femininas na ciência.
Visões epistemológicas contemporâneas, como abordado na terceira seção deste texto, e citadas por Harding, podem ser agrupadas em duas atitudes: aqueles que atribuem à filosofia da ciência papel normativo; e aqueles que assumem que a filosofia da ciência deve descrever o que as atividades humanas reconhecidas como ciência fazem. Os primeiros (e.g., Popper, Lakatos) entenderam que a filosofia deve estabelecer, idealmente, as normas que a ciência deveria obedecer, avaliando se as atividades científicas as seguem, sendo ciência ou não. Os segundos (e.g., Kuhn, Feyerabend, Toulmin) defenderam que se passasse a descrever as características daquilo que já era reconhecido como ciência, reconhecendo que a ciência não é pura, vincula-se a alguma política, filosofia ou necessidade econômico-social; e que a sociedade influencia e é influenciada pela ciência. Harding leva essa ideia ainda mais longe, examinando como a estrutura social das instituições acadêmicas guardam relações machistas, sexistas e propõe mudanças.
Argumentamos que a educação científica não pode estar ausente dessas reflexões. Hooks (2017) examina os medos de alguns professores, inclusive universitários, de assumir que educação nunca é neutra; insiste que o conflito de ideais pode, muitas vezes, causar desconforto e medo, mas tem a força de incitar discussões sobre a natureza da ciência e trocas. Novas visões sobre a ciência podem fomentar estratégias ativas, que contribuam para uma melhor compreensão da física/ciência.
Harding defende que o feminismo tem relevância crítica e construtiva para uma ampla gama de ciências; que a teoria feminista tem a ganhar através do diálogo construtivo com as ciências. Busca esclarecer os vários tipos de críticas feministas da ciência e nos convida à reflexão sobre o que o feminismo e a ciência têm a oferecer um ao outro, para enriquecer nossa compreensão sobre o mundo social e natural.
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Neusa Teresinha Massoni.
Licenciada em física, mestra e doutora em ciências pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). Professora associada na UFRGS e docente do Programa de Pós-Graduação em Ensino de Física do Instituto de Física da UFRGS. Desenvolve pesquisas nas áreas de epistemologias da ciência e suas implicações no ensino de física e na formação de professores. Massoni, N. T.; Moreira, M. A. O. Pensamento de Robert Merton sobre o desenvolvimento do conhecimento e da ciência: a Sociologia da
Ciência. Aceito pela Revista Contexto & Educação, vol. 38, n. 120, p. 1-17, 2023. http://dx.doi.org/10.21527/2179-1309.2023.120.11702. Gonzalez, G. A. N.; Massoni, N. T.; Alves-Brito, A.; Okido, D. H. Perfil da produção acadêmica a respeito do Movimento Ciência, Tecnologia e Sociedade (CTS) e do Pensamento Latino-americano em Ciência, Tecnologia e Sociedade (PLACTS) em revistas nacionais e internacionais da área de ensino de ciências. Caderno Brasileiro de Ensino de Física, v. 40, n. 2, p. 417-444, 2023. http://dx.doi.org/10.5007/2175-7941.2023.e86491. Slovinscki, L.; Alves Brito, A,; Massoni; N. T. Um diagnóstico da formação inicial de professores de Ciências Naturais na perspectiva do Ensino de Astronomia. Investigações em Ensino de Ciências – IENCI, v. 28, n. 2, p. 352-373, 2023. gObWvo%3D&reserved=0" https://doi.org/10.22600/1518-8795.ienci2023v28n2p352
Maurício Marçal Gonçalves Pazetto.
Licenciado em filosofia pela UFRGS. Atualmente é aluno do curso de licenciatura em física da UFRGS. Interessado em pesquisa e estudos de História da Física e Filosofia da ciência
* Este texto apresenta ideias da filósofa da ciência feminista Sandra Harding sobre o processo de desenvolvimento e sobre a estrutura social da ciência. Faz reflexões sobre as implicações dessas ideias para o ensino de ciências. Contato com autor: neusa.massoni@ufrgs.br . Não há conflitos de interesse a declarar e o projeto que resultou no presente artigo não tem financiamento de nenhuma instituição brasileira ou internacional