Comissionar a verdade e a memória na sociedade
No. 97 (2019-01-01)Autor(es)
-
Gabriel Ruiz RomeroUniversidad de Medellín (Colombia)
-
Marije HristovaConsejo Superior de Investigaciones Científicas (España)
Resumo
Objetivo/contexto: este artigo analisa a função política assumida por uma comissão da verdade como um organismo localizado no centro das diferentes disputas de memória que ocorrem em sociedades que enfrentam um passado violento. O texto propõe que a principal função de uma comissão da verdade não é a construção da verdade, mas a promoção e fortalecimento de um novo regime de verdade que se oponha ao que foi construído através do exercício da violência. Analisando o caso colombiano, o artigo examina criticamente o conceito de “reconciliação” que está por trás do trabalho de uma comissão desse tipo, como mecanismo de justiça transicional. Propõe-se que a comissão da verdade evita a promoção de uma reconciliação nacional, que é entendida como um pacto para encerrar o passado violento em um muro intransponível que não torne obrigatório assumir responsabilidades e consequências no presente. Em vez disso, o artigo argumenta que uma comissão da verdade deve promover uma reconciliação da sociedade, ou seja, um processo que buque preservar certos canais comunicativos com o passado violento, ao mesmo tempo em que aborda as causas que propiciaram o surgimento e naturalização dessa violência. Metodologia: a pesquisa foi guiada pela premissa gadameriana de questionar as próprias certezas. A partir da experiência em pesquisa na área da memória, da própria experiência de pesquisadores na elaboração de relatórios oficiais de memória histórica, o que embasa o artigo é um trabalho hermenêutico de indagação geral sobre a função do trabalho da memória em períodos de transição e, em particular, sobre os desafios de uma comissão da verdade. Conclusões: o artigo conclui que o trabalho central de uma comissão da verdade não é tanto a recuperação de memórias específicas (“isso aconteceu desse jeito”), mas a construção de um quadro social de legitimação da memória do sofrimento. Isso implica um esforço para incorporar esse sofrimento na representação geral da sociedade, nas suas necessidades e nos seus valores. Nesse sentido, embora enunciada como um instrumento para a busca da verdade, a real utilidade social e política de uma comissão da verdade pode estar em sua capacidade de construir um novo regime de verdade que abra um espaço atual para entender os padrões vigentes de violência e reconhecer seus agentes atuais. O artigo conclui também, para o caso colombiano, que a Comissão para o Esclarecimento da Verdade, da Convivência e da Não Repetição deve funcionar como competência de uma esfera pública narrativa. Sendo assim, deve-se buscar a criação de quadros de significado que possam desenvolver narrativas contrahegemônicas que possam, inclusive, se tornar incômodos em termos sociais. Trata-se de abrir a possibilidade de que diferentes agentes sociais, tradicionalmente localizados à margem do Estado, possam se posicionar para enfrentar, através do discurso, o próprio Estado e os grupos que buscaram impor seu relato a partir do domínio armado ou controle da esfera pública. Originalidade: o boom dos estudos da memória na segunda metade do século XX fez com que eles fossem realizados a partir de uma série de disciplinas e perspectivas dentro das Ciências Sociais. O nosso é uma abordagem hermenêutica que não procura explicar o conteúdo da memória ou do caráter da verdade que é produzida no trabalho institucionalizado da memória, mas situa a sua análise nas possibilidades de desenvolvimento de um espaço de ressonância narrativa no qual seja possível o surgimento de um regime de verdade alternativo.
Referências
Adorno, Theodor.1984. Dialéctica negativa. Madrid: Taurus.
Agamben, Giorgio.2014. Lo que queda de Auschwitz. Madrid: Pre-Textos.
Ahmed, Sara.2015. The Cultural Politics of Emotion. Nueva York: Routledge.
Arendt, Hannah.2007. Responsabilidad y juicio. Buenos Aires: Paidós.
Arendt, Hannah.2009. La condición humana. Buenos Aires: Paidós.
Bakiner, Onun.2016. Truth Commissions: Memory, Power, and Legitimacy. Filadelfia: University of Pennsylvania Press.
Benjamin, Walter.1991. El narrador. Para una crítica de la violencia y otros ensayos. Iluminaciones IV. Madrid: Taurus.
Bevernage, Berber y LoreColaert.2014. “History from the Grave? Politics of Time in Spanish Mass Grave Exhumations”. Memory Studies 7 (4): 440-456. https://doi.org/10.1177/1750698014537669
Brunkhorst, Hauke.2007. “Violencia, democracia y reconciliación”. En Las víctimas frente a la búsqueda de la verdad y la reparación en Colombia, editado por GuillermoHoyos, 31-48. Bogotá: Pontificia Universidad Javeriana.
Butler, Judith.2017. Cuerpos aliados y lucha política. Hacia una teoría performativa de la asamblea.Barcelona: Paidós.
Buur, Lars.2001. “The South African Truth and Reconciliation Commission: A Technique of Nation-State Formation”. En Ethnographic Explorations of the Postcolonial State, editado por ThomasHansen y FinnStepputat, 49-181. Durham: Duke University Press.
Calveiro, Pilar.2006. Los usos políticos de la memoria. Buenos Aires: Clacso.
Cento Bull, Anna y HansHansen. 2015. “On Agonistic Memory”. Memory Studies 9 (4): 390-404. https://doi.org/10.1177/1750698015615935
Das, Veena y DeborahPoole.2008. “State and Its Margins”. En Anthropology in the Margins of the State, editado por VeenaDas y DeborahPoole, 3-33. Santa Fe: School of American Research Press.
DeGloma, Thomas.2015. “The Strategies of Mnemonic Battle: On the Alignment of Autobiographical and Collective Memories in Conflicts over the Past”. American Journal of Cultural Sociology 3 (1): 156-190. URL: https://link.springer. com/article/10.1057/ajcs.2014.17
Derrida, Jacques.2003. El siglo y el perdón. Seguida de Fe y saber. Buenos Aires: Ediciones de la Flor.
Erll, Astrid.2012. Memoria colectiva y culturas del recuerdo. Estudio introductorio.Bogotá: Ediciones Uniandes.
“‘Es imposible construir una nación solo entre buenos’: De Roux”. 2018. El Tiempo, 12 de mayo, URL: http://www.eltiempo.com/politica/proceso-de-paz/entrevista-con-el-padre-francisco-de-roux-sobre-el-papel-de-la-comision-de-laverdad-216780
Ferrándiz, Francisco.2010. “De las fosas comunes a los derechos humanos: El descubrimiento de las desapariciones forzadas en la España contemporánea”. Revista de Antropología Social 19: 161-189. URL: https://revistas.ucm.es/index. php/RASO/article/view/RASO1010110161A
Foucault, Michel.1976. Vigilar y castigar: El nacimiento de la prisión. Madrid: Siglo XXI.
Geertz, Clifford.2003. La interpretación de las culturas. Barcelona: Gedisa.
Gómez, Hernando.2016. “Perdonar todos los crímenes y a todos los criminales”. Razón Pública, 14 de marzo, URL: https://www.razonpublica.com/index.php/conflicto-drogas-y-paz-temas-30/9299-perdonar-todos-los-crimenes-y-a-todoslos-criminales.html
Grupo de Memoria Histórica, GMH-CNRR.2009. Memorias en tiempo de guerra. Repertorio de iniciativas. Bogotá: Punto Aparte Editores.
Halbwachs, Maurice.1992. On Collective Memory. Chicago: Chicago University Press.
Hansen, Thomas y FinnStepputat.2001. “Introduction: States of Imagination”. En States of Imagination. Ethnographic Explorations of the Postcolonial State, editado por ThomasHansen y FinnStepputat, 1-40. Durham: Duke University Press.
Hayner, Priscilla.2001. Unspeakable Truths: Transitional Justice and the Challenge of Truth Commissions. Nueva York: Routledge.
Hunt, Tristram.2002. “In the Scales of History”. The Guardian, 6 de abril, URL: https://www.theguardian.com/education/2002/apr/06/artsandhumanities. highereducation1
Hunt, Tristram.2004. “Whose Truth? Objective Truth and a Challenge for History”. En Truth Commissions and Courts. The Tension between Criminal Justice and the Search for Truth, editado por WilliamSchabas y ShaneDarcy, 193-198. Dordrecht: Kluwer Academic Publishers.
International Center of Transitional Justice (ICTJ).2013. “Ignorando sus demandas de Justicia, Sudáfrica avanza ante las víctimas del apartheid”. URL: https://www.ictj.org/es/news/ignorando-sus-demandas-de-justicia-sudafricafracasa-ante-las-victimas-del-apartheid
Jelin, Elizabeth.2002. Los trabajos de la memoria. Madrid: Siglo XXI.
Joinet, Louis.1997. “The Administration of Justice and the Human Rights of Detainees. Question of the Impunity of Perpetrators of Human Rights Violations (Civil and Political)”. United Nations, Commissions on Human Rights. URL: http://www.derechos.org/nizkor/impu/joinet2.html
Laclau, Ernesto.2006. La razón populista. Buenos Aires: FCE.
Levi, Primo.2014. Los hundidos y los salvados. Barcelona: Ediciones Península.
Levy, Daniel y NatanSznaider. 2006a. “Sovereignty Transformed: A Sociology of Human Rights”. British Journal of Sociology 57 (4): 657-676. https://doi.org/10.1111/j.1468-4446.2006.00130.x
Levy, Daniel y NatanSznaider. 2006b. The Holocaust and Memory in the Global Age.Filadelfia: Temple University Press.
Levy, Daniel y NatanSznaider.2010. Human Rights and Memory. University Park: Pennsylvania State University Press.
Mate, Manuel-Reyes.2008. Justicia de las víctimas. Terrorismo, memoria, reconciliación. Barcelona: Anthropos.
Mate, Manuel Reyes.2011. Tratado de la injusticia. Barcelona: Anthropos.
Moses, Dirk y MichaelRothberg.2014. “A Dialogue on the Ethics and Politics of Transcultural Memory”. En Transcultural Turn. Interrogating Memory Between and Beyond Borders, editado por LucyBond y JessicaRapson, 29-38. Berlín: Walter de Gruyter.
Norval, Aletta.2001. “Reconstructing National Identity and Renegotiating Memory: The Work of the TRC”. En States of Imagination. Ethnographic Explorations of the Postcolonial State, editado por ThomasHansen y FinnStepputat, 182-202. Durham: Duke University Press.
Nytagodien, Ridwan y ArthurNeal.2004. “Collective Trauma, Apologies, and the Politics of Memory”. Journal of Human Rights 3 (4): 465-475. https://doi. org/10.1080/1475483042000299714
Olick, Jeffrey.2008. “From Collective Memory to the Sociology of Mnemonic Practices and Products”. En Cultural Memory Studies: An International and Interdisciplinary Handbook, editado por AstridErll y AnsgarNünning, 151-161. Berlín: Walter de Gruyter.
Orozco, Iván.2009. Justicia transicional en tiempos del deber de la memoria. Bogotá: Universidad de los Andes.
Orwell, George.2018. 1984. Barcelona: Penguin Random House.
Ricoeur, Paul.1998. La lectura del tiempo pasado: memoria y olvido. Madrid: Arrecife.
Ricoeur, Paul.2013. La memoria, la historia, el olvido. Buenos Aires: FCE.
Rothberg, Michael.2015. “De Gaza a Varsovia: hacia un mapa de la memoria multidireccional”. En Estudios sobre memoria: Perspectivas actuales y nuevos escenarios, editado por SilvanaMandolessi y MaximilanoAlonso, 21-52. Villa María: Euvim.
Roux, Francisco de.2017. “Empieza la comisión de la verdad”. El Tiempo, 16 de noviembre, URL: http://www.eltiempo.com/opinion/columnistas/francisco-deroux/empieza-la-comision-de-la-verdad-151684
Shaw, Rosalind.2005. Rethinking Truth and Reconciliation Commissions. Lessons from Sierra Leone.Washington: United Stated Institute for Peace.
Slaughter, Joseph.2007. Human Rights, Inc. The World Novel, Narrative Form, and International Law. Nueva York: Fordham University Press.
Stein, Dan, SorayaSeedat, DebraKaminer, HashimMoomal, AllenHerman, JohnSonnega y DavidWilliams. 2008. “The Impact of the Truth and Reconciliation Commission on Psychological Distress and Forgiveness in South Africa”. Social Psychiatry and Psychiatric Epidemiology 43: 462-468. https://doi.org/10.1007/s00127-008-0350-0
Todorov, Tzvetan.2013. Los abusos de la memoria. Barcelona: Paidós.
Traverso, Enzo.2007. El pasado, instrucciones de uso: historia, memoria, política.Madrid: Marcial Pons.
Uprimny, Rodrigo, María PaulaSaffon, CatalinaBotero y EstebanRestrepo. 2006. ¿Justicia transicional sin transición? Verdad, justicia y reparación para Colombia. Bogotá: Dejusticia.
Licença

Este trabalho está licenciado sob uma licença Creative Commons Attribution-NonCommercial-NoDerivatives 4.0 International License.